Entre os anos de 2002 e 2005 meu tempo esteve focado à pesquisa acadêmica com a finalização de meu Trabalho de Conclusão de Curso à titulação Bacharel, escrevendo o TCC enquanto eu estudava as representações dos personagens não nacionais em Marco Zero, de Oswald de Andrade. Foi um período importante em que pude participar de Congressos de Teoria e Literatura como o de Bakhtin em 2003, em Curitiba, e o ABRALIC de 2004, em Porto Alagre, quando participei com uma explanação sobre “Representações Transitivas – Observações relativas às possibilidades representacionais dos sujeitos da migração em Marco Zero, de Oswald de Andrade”, participando à Mesa-Redonda 2 de coordenação de Fábio Renato Correa, em 21 de julho daquele ano.
O foco da pesquisa estava, portanto, centrado nessas personagens não-nacionais e eu me encontrava em volto ao tema dessas representações na literatura brasileira, especialmente dedicado a entender como um romance-mural de Oswald de Andrade alcançava a ideia de refletir um período histórico brasileiro conhecido como Estado Novo, sendo um movimento paulista dos anos de 1940.
Aconteceu que durante a pesquisa da bibliografia relacionada à representação, um texto em particular me veio como uma luva ao que, paralelamente, eu pesquisava por interesse autodidata.
Encontrei um artigo de Franz Josef Brüseke, intitulado “Mística, magia e técnica” que abrangia a uma produção de Marcel Mauss, fundamental ao campo da sociologia e da antropologia, uma formação em eu começava a me aventurar com mais vontade, mas em que não pude me dedicar de imediato, já que, na esteira da minha pesquisa acadêmica da época, eu estava mais ligado aos teóricos pós-colonialistas, orientalistas, sendo uma base teórica importante para os estudos culturais pós-modernos do final do século XX. Dessa forma, deixei esse texto de Brüseke guardado para um melhor momento, sabendo que o tema e o título “Mística, magia e técnica” já era do meu interesse havia anos!
O interesse pelo misticismo, seja essa expressão ligada aos poemas místicos orientais, ou pelas poesias místicas de São João da Cruz, padroeiro dos místicos e poetas pela literatura sacra católica, foi recorrente durante toda a minha leitura de mundo. Depois, a questão da magia me interessava por seus ritos na tradição de um chamado “homem primitivo” que, também interpretado “xamã” na realidade, traz uma técnica que seria levada a estudo em meu “Estados de Civilidade: uma história sobre tecnologias“, publicado no ano de 2020. E aqui preciso fazer uma correção ao meu livro: corrigir a ausência de um título que me ajudou a entender a questão de um tema esotérico abordado dentro de uma formação acadêmica.
O artigo é “Mística, magia e técnica” do Doutor em Sociologia Franz Josef Brüzeke que em 50 páginas sintetiza um sentido de magia, misticismo e técnica, dado em contraposição à representação de coletividade, tanto de Durkheim (a magia e o sagrado), citado em meu livro, quanto de Marcel Mauss em seu “Esboço de uma Teoria Geral da Magia” (1950) cujo ensaio “Sobre a dádiva” é recorrentemente citado em inúmeros artigos voltados à análise da cultura da representação da troca dentro do que é considerado, também, um espaço cultural.
Quanto ao artigo de Doutor Brüseke, esse é admirável por alguns motivos importantes. Por uma linguagem acadêmica acessível que nos leva a entender que:
As forças mágicas não são, na imaginação do homem primitivo, arbitrárias ou espontâneas. Elas são, portanto, um automatismo que, equipado de espírito, permeia o mundo inteiro e é manipulável através da “fórmula” adequada. (…) A fascinação do homem pela técnica parece ter a mesma raiz que a da magia.
De “Mística, magia e técnica” de Franz Josef Brüseke (2005; p.167).
Contexto do interesse
O artigo “Mística, magia e técnica é, também, importante pela apresentação temporal do pensamento místico com base no estudo do “sagrado” em 03 grandes fases: a da “Filosofia Mística” que compreende os filósofos pré-socráticos, a começar com Anaximandro, século VII a. C. e Heráclito, passando por Platão e Plotino; a da Teologia Mística que começaria com Dionisius Areopagita ou também chamado Pseudo-Areopagita, século VI d. C. (É em todo Idade Média Europeia que o Misticismo Teológico parece abranger mais autores e referencias marcantes como, na tradição Católica, São Francisco de Assis, São Tomás de Aquino e Ignácio de Loyola, já na Espanha do período Moderno, quando a mística cristã, no século XVI, teve um novo ponto de culminação” com a reforma da Ordem das Carmelitas apoiada por João da Cruz (Juan de la Cruz), “o doutor extático que dá um tom místico à poesia do amor”.)
Finalmente, pelo artigo de Franz Josef Brüseke, nos encontramos com a terceira e última fase do que seria uma ordenação cronológica da interpretação representada pela palavra “místico”, ou “misticismo”, o que nos leva aos atuais dias, e essa fase seria a de “Místicas sem Deus”, quando Brüzeke aborda Wittgenstein e renomados da Física Moderna.
Para saber mais sobre Franz Josef Brüseke:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_da_Cruz#Obras_liter%C3%A1rias
A poesia mística de São João da Cruz em perspectiva dialógica:
https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/123456789/19996?locale=pt_BR