Nascemos para o desconhecido
Ainda que muito do que se tenha a respeito sobre um estudo sério da anterioridade mística das tradições, (muitos das quais conhecemos por esotéricas), seja feito com base, originalmente, em relatos orais que se estendem pelos séculos e na memória, devemos supor de sua existência mística* em função da realidade instrumental que se manifesta em nosso cotidiano como sistema de comparações de significados dentro dos quais há o espaço da potência da realidade que é virtual, e no qual, no centro, estão os relacionamentos e os valores à convivência humana.
Esse aprendizado pode vir em razão das gerações passadas, dos conhecimentos que são chamados ancestrais, e que, por vezes, demonstram a realidade comum a toda natureza humana. Nesse sentido, encontramos algumas teses que tratam a respeito e que se valem de uma mesma ideia fundamental, embora, entre si, possa até não haver relação direta, ou mesmos serem elas completamente antagônicas. Isso, pelo que nos assiste, existe porque se deve a um conjunto de saberes instituídos em uma percepção de experiências como objetos no mundo. Estão determinados. E vale dizer que o ser humano não determina seu aprendizado apenas por si, senão por meio de comparações, sob suas próprias medidas, do que lhe faz, ou não, parte integral como fatos de escolhas que lhe são livres.
As tradições, portanto, sejam elas religiosas, científicas ou esotéricas ocultistas, são "impressos" a comportamentos sociais, podendo esses, ou não, serem instituídos em hierarquias, constituindo "corpos" ou não de literatura sagrada, ou simplesmente sendo uma tradição propagada pela oralidade de contar histórias através das gerações, sendo, dessas tradições orais, uma ideia da origem da organização humana secular, daí já existindo teses sobre o tema.
Nossos estudos em artesfatos.com contribuem ao objetivo de trazer, por meio de pesquisas fundamentadas, um rico comparativo entre linguagens tecnológicas em áreas como a da antropologia, a da história e da cultura humana secular cujos parâmetros técnicos relacionados à religião instrumental nos possibilita uma literatura operativa. Em especial, duas recentes leituras que, comparadas, nos mostram elementos culturais distintos de um mesmo cenário de funcionamento hierárquico e institucional, capitulado por "Ordens".
Em chuva de estrelas - o sonho iniciático no sufismo e taoismo, de Peter L. Wilson, conhecemos as tradições sufis pelo campo da questão da autoridade, independente da crença ou descrença à prática espiritual, tratando do "Sofismo das Ordens" como sociedades em que as modalidades de estudo e de posicionamento estratégico são de "estados incomuns de consciência", estados esotéricos que escapam "do discurso totalitário da autoridade mística ou religiosa", discurso que é foco do autor, propondo-se ele a uma "tradição do 'Espírito Livre'" (WILSON, 2004; p. 14). [Mundus Imaginalis]
Não por acaso, a "liberdade de pensamento" parece ser tônica permanente entre os franco-maçons quando se trata da leitura de A Maçonaria e outras sociedades secretas, de Ralph T Beck. E notável é o panorama que o mesmo autor apresenta sobre o tema, demonstrando os paradoxos presentes nas "Ordens", com ilustrações de nomes importantes na geopolítica mundial dos últimos quatro séculos.
Fundamentalmente, em ambos, observa-se um posicionamento plural de investigação do pensamento humano, sendo esse posicionamento uma prática instrumentalizada de conhecimentos tratados desde suas origens como imemoriais. Diz-se que, na Antiguidade, os homens chegavam à religião pela busca do conhecimento, pelas tradições de se manter os costumes e as línguas em que se comunicavam, desenvolvendo eles suas habilidades em Templos que se tornavam espaços de estudos, a exemplo da tradição tanto hebraica quanto muçulmana em suas origens remotas.
Nas duas obras citadas acima, percebe-se que a preocupação dos respectivos autores está em se distanciarem da literatura sacra das "Ordens" (multiforme muitas das vezes) para se proporem a analisar mais de perto a liberdade do indivíduo na sua autoconstrução, procurando distância de um mundo mítico a fim de se tornarem mais próximos a uma visão crítica e racionalista quanto às hierarquias das quais são possivelmente partes como engrenagens de um mesmo sistema mais amplo.
Direção de Pesquisa e de Desenvolvimento - Egídio Mariano. Caso queira, você pode enviar e-mail para contato@aprendizdigital.net para críticas, sugestões e contribuições a nossa pesquisa.
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*Sobre o tema, saiba mais em "Sociologia da mística", de Carlos Eduardo SELL, via acervo digital da ampocs.org, acessível AQUI)
Obras Citadas:
BECK, Ralph T. A maçonaria e outras sociedades secretas; trad. Ciro Aquino. SP: Editora Planeta Brasil, 2005.
WILSON, Peter Lamborn. Chuva de estrelas: o sonho iniciático no sufismo e taoismo; trad. Alexandre Martins. SP: Conrad Editora Brasil, 2004.
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